Era um bar, um boteco como outro qualquer, nem melhor, nem pior, talvez um pouco mais sujo, mais mal iluminado, mais mal localizado, mas nada além de um bar como outro qualquer.
Chão de cor indefinida, como a vida que lá existia, balcão de fórmica gasta, de uma cor que talvez um dia, sob o olhar orgulhoso do proprietário, até fosse azul, hoje, era pálido como o dono que dormitava entre copos não recolhidos e moscas que vicejavam num festim pobre de restos dos poucos e rachados pratos em cima do balcão.
Prateleiras, duas para tentar ser exato, onde garrafas de bebidas baratas brilhavam como neon aos olhos de quem lá entrava, cintilavam mais que os copos sujos e empilhados num canto escuro que não permitia identificar sua origem e estado real.
Quatro mesas, cercadas de cadeiras desiguais, como se fossem acólitos cansados de uma rainha destronada e recolhidos ao acaso naquela última homenagem. Uma mesa vazia, embaixo de um pôster da seleção brasileira de 1970, amarelado e nostálgico a evocar glórias passadas, ecos de outra época, mas ecos sem voz, ecos de olhar triste.
Numa mesa, um casal. Não se falavam e nem se olhavam, mutuamente se excluindo, não por raiva ou ressentimento, mas por falta do que unir, só a cerveja sorvida sem pressa e sem prazer, era o elo. Em outra, uma pessoa, um homem de idade indefinida, com o ar da rendição, não o da renúncia consciente, ou da derrota sentida, não, era o da desistência não percebida, do não importa mais, do esqueci porque estou aqui.
E por último, ao apertar os olhos, tentando ver através da fumaça dos cigarros, pensei ter visto Fante, Kerouac e Bukowski, que entre goles de Bourbon e imprecações rejeitavam a sociedade que não os queira, mandavam à merda as convenções na valentia dos bêbados, e riscavam na toalha imunda as bases do novo mundo, da uma nova era que todos sabiam que nunca chegaria.
Quando me levantei para brindar a isto, a fumaça se dissipou com um vento impertinente que soprava da rua escura, e eles tinham sumido, substituídos por dois motoristas de ônibus que dividiam a ultima cerveja da noite quase dia, entre mordidas desanimadas em pastéis que conheceram épocas melhores.
O dia brigava com uma noite relutante e o sol insistia por trás de nuvens carregadas, a exigir sua presença. Ao clarear o bar sumiu com seus personagens, em seu lugar, uma lotérica, com filas de sonhos e contas a pagar, acordei.
Teria sonhado com isto, ou o sonho foi o do dia? Nunca saberei, não mais voltei lá, nem me importa saber, afinal era só um bar, um boteco, nem melhor, nem pior...
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