Chuva fina e
constante encharcando a terra, ar frio chegando, é o inverno espiando pelas
costas do outono. As árvores se despem de sua roupagem de primavera, na dança
sensual da queda das folhas embalada pelo canto do vento frio. Os casacos
esquecidos entopem as gavetas, os corpos se recolhem na roupa pesada e a alma
hiberna. A festa pública do verão e primavera é substituída pela reunião íntima
o final de outono e do inverno. Os poetas suspiram pela melancolia da estação,
eu que não sou um deles, considero a melancolia como um soluço da alma.
Penso que
existam duas estações, uma externa, a do calor e da luz, e uma interna, a da
reflexão e do recolhimento, cada uma com seus encantos e desencantos cada uma
deixando sua marca em nós.
As estações
na literatura foram largamente usadas como metáforas para a vida, e não sem
propriedade. Nós, seres humanos precisamos de cronologia, sem etapas claras,
sem eras e períodos, como poderíamos entender a nossa história? Seria como ler
um trecho sem pontos, vírgulas e parágrafos. Quantos mal-entendidos existiriam
por falta de pausas e vírgulas. Quantas coisas seriam impossíveis de se entender
pela falta de parágrafos, momentos diferentes se misturando, se confundindo
mutuamente, se atropelando no curso inexorável do texto.
Na infância
do homem, a vida era medida pelas estações, o tempo dos frutos, o tempo do sol,
o tempo do frio, o tempo da procriação. Com o inicio da dita civilização,
passou-se a cultivar o perigoso engano de que poderíamos entender o nosso
tempo, no máximo podemos tentar medi-lo em uma régua canhestra, classificá-lo e
codificá-lo segundo nossa ansiedade. No entanto, como um texto sem pausas, ele
segue atropelando a nossa pretensão. .
E o inverno
ali, espiando, como sempre fez, faz e sempre fará, porque a vida, ainda é,
apesar de tudo, apesar do que tentei dizer, um texto sem pausas, de poucas
vírgulas...
Nenhum comentário:
Postar um comentário